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Foto do escritorDr. Lucas Rosado

O fornecedor de ingressos pode cobrar taxa de conveniência nas vendas realizadas de forma online ?

Atualizado: 15 de jun. de 2023




Acredito que em algum momento você já tenha comprado ingressos para poder ir a algum espetáculo, evento ou show de música. Muitas empresas, atualmente, oferecem ao consumidor a opção de comprar o ingresso pela internet, pois o avanço dos recursos tecnológicos facilitou tanto a vida do fornecedor, que pode vender uma quantidade maior de ingressos para consumidores que encontram-se fora do alcançe da região da bilheteria física, quanto a dos consumidores, que podem adquirir esses produtos sem saírem de casa.


Contudo, se você já comprou algum ingresso utilizando-se dessa plataforma, deve ter notado que além do valor do ingresso algumas empresas cobram um encargo extra nominado de ''taxa de conveniência''. Essa ''taxa de conveniência'' é justificada pela empresa como sendo um encargo cobrado do consumidor em virtude da facilidade que a mesma está proporcionando ao disponibilizar o método de aquisição online do ingresso. Mas afinal de contas, essa cobrança é legal ? As empresas podem cobrar a mais dos consumidores que optaram pela aquisição do produto pela internet ? A resposta é NÃO.


A jurisprudência pátria considera a cobrança de ''taxa de conveniência'' por parte dos fornecedores que trabalham com venda de ingressos online como sendo uma prática abusiva rechaçada pelo artigo 39, incisos I e IX do Código de Defesa do Consumidor.


E por qual razão ela é tida como uma prática abusiva ?


Porque o condicionamento da venda dos ingressos ao pagamento de uma taxa extra constitui venda casada, prática essa que é proibida nas relações de consumo pela legislação consumerista.


E o que é uma venda casada ?


A venda casada ocorre quando o fornecedor de produtos ou serviços estabelece uma condição para aquisição de determinado produto ou serviço através do fornecimento de outro produto e serviço que normalmente não é da escolha do consumidor. Ficou confuso ? Vamos nos utilizar de um exemplo mais simples então. Imagine que você está no supermercado e está precisando comprar macarrão para fazer uma macarronada. O pacote do macarrão aparece com o preço de R$ 5,00 (cinco reais). Quando você chega no caixa para passar a compra aparece que a cobrança do macarrão é de R$ 15,00 (quinze reais). Ao estranhar esse fato, você chama o gerente para pedir esclarecimentos e ele te mostra que no anúncio do macarrão, em letras miúdas, diz que para levar o macarrão a R$ 5,00 (cinco reais) você precisa levar uma lasanha de R$ 14,00 (quatorze reais). Note que você foi ao mercado porque queria fazer uma macarronada e não uma lasanha, mas o fornecedor está condicionando a venda do macarrão à aquisição da lasanha, incorrendo assim em venda casada.


O exemplo simplista mencionado acima serve apenas para ilustrar, mas a venda casada ocorre quando o fornecedor condiciona a aquisição de um produto/serviço ao fornecimento de outro produto/serviço que normalmente não é desejado pelo consumidor. E o CDC coibe essa prática, classificando-a como prática abusiva de consumo, passível, inclusive, de anulação das cláusulas contratuais que estabeleçam essas condições, nos termos do artigo 51, incisos IV e X do CDC.


E como a cobrança da ''taxa de conveniência'' se encaixa nesse contexto de venda casada ?


Em um primeiro momento pode não parecer, mas obrigar o consumidor ao pagamento de uma taxa extra para aquisição de um produto via online, sendo aquela a única opção disponível para essa aquisição, constitui uma modalidade de venda casada indireta e dissimulada, ao passo em que também coloca o consumidor em uma posição extremamente desfavorável, atribuindo-lhe um encargo excessivo e desproporcional.


O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1737428/RS, nos termos do voto da Ministra Relatora Nancy Andrighi, considerou que a cobrança da ''taxa de conveniência'' é tida como venda casada ''às avessas'', indireta ou dissimulada, uma vez que ela restringe o exercício do consumidor unicamente àquela opção oferecida pelo próprio fornecedor, ofendendo assim sua liberdade escolha nesse sentido. Logo, o fato de os fornecedores de ingressos não disponibilizarem outros meios de aquisição destes produtos online a não ser um único sítio eletrônico, mediante a cobrança de uma taxa extra, implica no cerceamento da liberdade de escolha do consumidor. Ademais, o STJ ainda decidiu que a cobrança da ''taxa de conveniência'' ofende o artigo 39, inciso IX do CDC, uma vez que transfere o ônus empresarial decorrente do custo atrelado á utilização da plataforma intermediadora de compra e venda de ingressos online unicamente ao consumidor.


Diante dessas razões, considerando o posicionamento da jurisprudência firmada no âmbito do STJ, a cobrança de ''taxa de conveniência'' pode ser considerada como uma prática abusiva e que atenta contra as garantias do consumidor dispostas no CDC, sendo vedado às empresas procederem com essa cobrança.


E qual é a consequência prática disso tudo ?


Em virtude de ser considerada como uma prática abusiva, a venda casada enseja a anulação da cláusula contratual que estabeleceu tal condição. E a consequência dessa anulação faz com que o fornecedor de serviços seja obrigado a restituir, em dobro, o valor cobrado indevidamente, nos termos do artigo 42 do CDC. Ou seja, de acordo com a legislação consumerista, o consumidor deve receber duas vezes o valor que pagou de forma indevida a título de ''taxa de conveniência''.


E como devo proceder para receber minha restituição ?


Infelizmente será necessário recorrer ao Judiciário para promover a cobrança dessa restituição, já que essas empresas normalmente não realizam a simples devolução. No intuito de obstar o direito do consumidor, os fornecedores normalmente alegam que o pagamento da ''taxa de conveniência'' é justificado e devido, ignorando completamente o estabelecido pelo CDC e pela jurisprudência nacional.


E o que devo fazer nesse caso ?


Procure um profissional de sua confiança e submeta seu caso à análise. Ao final, se constatada a abusividade na cobrança, deverá ser ajuizada ação indenizatória no sentido de buscar, a título de danos materiais, a restituição da quantia que foi indevidamente paga a título de ''taxa de conveniência''.


A Lucas Rosado Advocacia coloca-se à sua disposição para esclarecimentos e atuação em demandas que envolvam o caso mencionado no presente artigo.

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